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Leituras Improváveis

um registo digital

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A ouvir

Março 12, 2025

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Tropeçavas nos astros desastrada
Quase não tínhamos livros em casa
E a cidade não tinha livraria
Mas os livros que em nossa vida entraram
São como a radiação de um corpo negro
Apontando pra a expansão do Universo
Porque a frase, o conceito, o enredo, o verso
(E, sem dúvida, sobretudo o verso)
É o que pode lançar mundos no mundo.


Tropeçavas nos astros desastrada
Sem saber que a ventura e a desventura
Dessa estrada que vai do nada ao nada
São livros e o luar contra a cultura.


Os livros são objetos transcendentes
Mas podemos amá-los do amor táctil
Que votamos aos maços de cigarro
Domá-los, cultivá-los em aquários,
Em estantes, gaiolas, em fogueiras
Ou lançá-los pra fora das janelas
(Talvez isso nos livre de lançarmo-nos)
Ou ­ o que é muito pior ­ por odiarmo-los
Podemos simplesmente escrever um:


Encher de vãs palavras muitas páginas
E de mais confusão as prateleiras.
Tropeçavas nos astros desastrada
Mas pra mim foste a estrela entre as estrelas.

 

 

Educação ou Barbárie, de Guilherme d'Oliveira Martins

Novembro 08, 2024

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O século XX, ao longo do qual se tem afirmado uma confluência inquietante entre a procura da felicidade e a consumação da barbárie, foi talvez demasiado triunfalista sobre as possibilidades da humanidade. O resultado foi bem evidente. O "excesso de sentido", o primado do fio vermelho da história, deu origem aos episódios sangrentos que deixaram a humanidade exangue, quando os mais optimistas anunciavam não apenas o bem-estar ao virar da esquina, mas também a reconciliação definitiva das sociedades - num "fim da história", em que a "ideia" de Hegel foi sendo interpretada de formas diversas.

E agora? Não se pense que estamos vacinados contra a barbárie pelas guerras e pelas tragédias do século XX. Não estamos. Há novos big brothers, que Orwell talvez não tenha previsto, que espreitam donde menos se espera. Sarajevo constitui um sério alerta. Na Europa há sinais de fragmentação social, bem evidentes na Itália do Norte, mas também nos países de forte imigração, onde os conflitos sociais têm intensificado fenómenos de intolerância.

A esta tendência, que põe em causa a concepção de "contrato social" em vigor no último meio século nas sociedades ocidentais, acrescem os novos problemas da "sociedade da informação" - que obrigam a repensar algumas bases do Estado de direito, como a legalidade e a legitimidade. O culto do efémero junta-se ao risco da tirania instantânea do número através do que podemos designar como caricatura electrónica da política e da sociedade. Esta transforma-se num reality-show - no qual a manipulação e a exploração de sentimentos primários se tornam métodos comummente aceites e praticados. Pluralismo e "relativismo ético" aparecem confundidos, convicção e opinião surgem como sinónimos. E, assim, a sociedade passa a ter dificuldade em assumir a diversidade e o espírito crítico, preferindo um "pensamento débil", de fronteiras ténues e valores difusos. Em vez de se tornar factor de enriquecimento, a diversidade é substituída pela anomia. Deste modo, o risco da "tirania do número"  leva a esquecer que a política e a cidadania exigem princípios, regras, equilíbrio de poderes e influências, freios e contrapesos e tempo - e que a legitimidade obriga a que haja instâncias de mediação, aptas a representar as pessoas, os cidadãos e as comunidades, a regular os conflitos, a garantir a coesão social e a assegurar a salvaguarda do pluralismo, como condição de liberdade e de autonomia. Usando a expressão de Tocqueville, trata-se, afinal, de afirmar "uma sociedade que age por si própria e sobre si própria".

excerto de Educação ou Barbárie, de Guilherme d'Oliveira Martins (Gradiva, 1998)

 

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